Gostei muito deste livro que já tem algumas décadas de edição no Canadá, mas que saiu agora, na Bertrand, com tradução de Rita Canas Mendes.
Atwood é uma escritora prolífica e dela já li muitas coisas, incluindo o Booker Prize de 2000, O Assassino Cego, e outros, como A História de uma Serva, Grace, O Coração é o íšltimo a Morrer”, Ressurgir, Os Testamentos, Coração de Pedra.
Neste Cat”™s Eye, Margaret Atwood conta-nos a história da pintora Elaine Risley, desde os tempos em que ela, os seus pais e o seu irmão, deambulavam pelas florestas canadianas, pouco depois do fim da Grande Guerra. O pai estudava insectos e a família ia atrás. Mais tarde, radicaram-se numa Toronto ainda por construir e por desenvolver. Elaine encontrou amigas, sobretudo uma, chamada Cordelia, que haveria de ensombrar o seu futuro. Vamos acompanhando a vida de Elaine, com muitas visitas ao passado, as suas paixões, a sua atitude cínica perante a vida.
Apesar da diferença entre a vida no Canadá no post-guerra e a vida num país como Portugal nessa época, encontramos alguns pontos de contacto.
Como este pedaço da infância de Elaine:
“…Dois dias depois, a Carol conta-nos que o pai lhe deu uma valente sova de cinto, com o lado da fivela, diretamente no rabo. Diz que mal consegue sentar-se. Parece orgulhosa disto. Depois das aulas, no seu quarto, mostra-nos: levanta a saia, baixa as cuecas, e lá estão as marcas, parecidas com arranhões, não muito vermelhas, mas efectivamente lá.”
Elaine torna-se uma pintora, digamos, feminista, mas sem acreditar muito nisso. Depois de um primeiro casamento falhado, conhece Ben, um homem tradicional. Acaba por gostar disso:
“…Anos antes, tê-lo-ia considerado demasiado óbvio, demasiado tolo, praticamente um simplório. E, durante anos depois disso, um chauvinista da espécie mais amistosa. Ele é todas essas coisas; mas também é como uma maçã, depois de um banquete desenfreado.
Vem a minha casa e repara o alpendre traseiro com os seus próprios serrote e martelo, como nas revistas femininas de antigamente, e depois bebe uma cerveja, no relvado, como nos anúncios. Conta-me anedotas que eu não ouvia desde os tempos do liceu. A minha gratidão por estes prazeres triviais surpreende-me. Mas não preciso dele, ele não é nenhuma transfusão. Ele agrada-me, só. É uma felicidade sentir-me agradada com algo tão simples”.
“…Olho de Gato” é um dos melhores livros que li nos últimos tempos.