Ele lê o jornal, sentado í mesa da cozinha, enquanto o namorado prepara o pequeno almoço para os dois.
– E o Sócrates lá aprovou o casamento entre pessoas do mesmo sexo!
– Não tinha outro remédio… até porque o Sócrates é cá dos nossos! – exclama o namorado.
– Lá estás tu a alinhar com essa malta dos boatos! Isso é conversa da oposição!
– Pois, pois! O que ele precisava era que lhe fizessem o que fizeram ao Berlusconi, só que, em vez de levar com o Duomo de Milão, levava com a torre de Belém e o Mosteiro dos Jerónimos na tromba! – azucrinou o namorado.
– Vê lá se mordes a língua e morres envenenado!
– Pronto, pronto! Não te zangues! Não se pode tocar no Sócratezinho que ele fica logo todo picado!…
Ele continua a folhear o jornal, mas com movimentos mais bruscos. Depois, diz, já com a voz um pouco alterada:
– É que é toda a gente contra o homem! Até o Cavaco, com aquele ar de eucalipto em tempo de seca, sempre a dizer que não interfere, que não se mete na política partidária e, depois, diz que a crise e a dívida externa são mais importantes que o casamento homossexual!
– A culpa é do Sócrates. Ele é que provocou o Cavaco! Quando o PSD voltar a governar é que vais ver a diferença! – grita o namorado, queimando-se na torradeira.
– Está mas é calado! O PSD não se consegue governar a si próprio, quanto mais o país! – vocifera o primeiro, atirando com o jornal para o chão.
– Mas agora, que o Pedro Santana Lopes vai pegar no partido outra vez, a coisa vai ser a sério!
– És mas és um grande parvalhão! O Santana Lopes deixa sempre tudo a meio, até os casamentos!
– Tu não me chamas parvalhão, meu ordinário!
– Ordinário és tu, meu estúpido!
– Olha! Vou mas é para casa da minha mãe!
– Vai, vai viver com essa lésbica que não tem onde cair morta!
O namorado sai, batendo com a porta.
Terão que aguardar até sair a lei do divórcio gay…