“Consolers of the Lonely”, dos Raconteurs

—Que disco bem esgalhado! Com mais duas ou três bandas destas eu poderia pensar que estava de volta a 1968-1970, que era outra vez um teen-ager e que estava a reviver um dos melhores períodos da música rock.

O rapazinho dos White Stripes, Jack White III (voz e teclas em geral) e mais uns amigos – Jack L.J. Lawrence (baixo, banjo, voz), Brendan Benson (sing, string, ring, ding, dong – literalmente) e Patrick Keeler (percurssão) – juntaram-se para este segundo disco que é um gozo, do princípio ao fim.

O disco faz-me lembrar o “Sgt Pepper’s”, dos Beatles por três razões: pelo som rock tipo anos 60, pelo título (“Consolers of the Lonely”, enquanto o Sgt. Pepper´s era a Lonely Heart’s Club Band) e pela capa, que mostra os quatro rapazes com um bombo ao fundo, muito semelhante ao que está, em primeiro plano, na capa do álbum dos Beatles.

De resto, a sonoridade do disco tem mais a ver com outras bandas dos anos 60/70, nomeadamente Led Zeppelin, Fleetwood Mac, do tempo do Peter Green, Ten Years After, Blind Faith e outros que tais.

Há faixas que valem a pena ouvir várias vezes; por exemplo, “The Switch and the Spur”, que me faz lembrar a música do western-spaghetti “The Good, the Bad and the Ugly”; “Many Shades of Black”, que poderia ser uma coisa dos Blood, Sweat and Tears, com os metais e tudo; “Five on the Five”, que é uma faixa Led Zeppelin, chapada, incluindo a voz do rapazinho e, sobretudo, os solos de guitarra, um dos quais parece mesmo roubado do Plant; e mais, e mais.

Toca a ouvir!

“Frank”, de Amy Winehouse

—Mea culpa! Ouvi hoje, pela primeira vez, o disco de estreia de Amy Winehouse, publicado há 5 anos.

Porquê?

Porque gosto muito pouco de unanimismos e ao ver, constantemente, referências a esta Amy, por razões outras, que não as musicais, achei que ela não devia passar de mais um fenómeno publicitário, como muitos outros que por aí andam e com os quais não vale a pena perder tempo.

De qualquer modo, de quando em vez, sentia curiosidade em saber o que raio esta Amy teria de tão especial. Seria só o facto de ter «voz de preta», de ter umas pernas de alicate e vestir-se í  anos 50, de ter uma cabeleira estranha e de estar sempre encharcada em álcool e drogas?

Confesso que o pedacinho da sua actuação bêbada no roquemrio, que as televisões transmitiram funcionou como gatilho e hoje, finalmente, comprei “Frank”, o disco de estreia desta miúda que, na altura, tinha 20 anos e que, de facto, tem uma voz do caraças, lembrando Sarah Vaughan ou Billie Holiday. Para além disso, as canções têm, quase todas, um swing que “já não se usa” e que soa muito bem, apesar de uma ou outra piroseira que, apesar disso, soa muito melhor que a maior parte da merda que anda por aí.

Sinceramente, fico espantado como Amy Winehouse consegue arrastar multidões. As suas canções deveriam ser para uma minoria – a menos que as multidões sejam arrastadas por outras razões, relacionadas com os escândalos, o mau comportamento, as drogas e o álcool, as transgressões, que tanto agradam aos adolescentes.

É quase impossível não comparar Winehouse a Janis Joplin, quanto mais não seja, pelos excessos. No entanto, penso que Joplin estava mais de acordo com a sua época; ela cantava rythm & blues e rock puro e duro, numa altura em que muitos o faziam. Agora, esta Amy, ousa cantar coisas que estão completamente fora do actual “mainstream”.

Está visto, a Winehouse ganhou um fã cinquentão…

“Anywhere I Lay My Head”, de Scarlett Johansson

—Por que razão uma actriz talentosa como Scarlett Johansson grava um disco com versões de canções do Tom Waits?

Porque pode.

Como fã de Waits, comprei, ouvi e não gosto.

Os arranjos, a cargo de David Sitek são pomposos e muito ruidosos. Quase todas as canções têm uma espécie de parede sonora que não nos deixa ouvir muito bem a voz de Scarlett – e, se calhar, é de propósito, porque a menina, provavelmente, não sabe cantar. No texto introdutório do disco, diz-se que Sitek queria que o disco soasse a This Mortal Coil ou Cocteau Twins. Isso talvez ele tenha conseguido, nomeadamente com a voz da Scarlett, que está lá ao fundo, como se estivesse dentro de qualquer coisa metálica, mas o conjunto não é muito estimulante.

Por outro lado, escolher dez canções do Tom Waits também não é fácil e cada um de nós escolheria outras dez, que não fossem estas. De qualquer modo, as canções simples de Waits valem muito pelas histórias que ele conta e, no caso de Scarlett, nem isso se percebe.

Fiasco, acho eu…

“Third”, dos Portishead

portishead.jpegNunca fui muito í  bola com a música dos Portishead. Aquela coisa dos discos parecerem riscados, sempre me pareceu um truque intelectualóide. E a voz da menina irritava-me, sempre tão aflita, tão deprimida, tão “tirem-me daqui, que não suporto viver”! A arte como sofrimento encenado, sempre me fez comichões. Além disso, confesso que também nunca os ouvi com atenção.

Em 2005, no entanto, a voz de Beth Gibbons despertou-me a atenção, no disco “Cinema”, de Rodrigo Leão. Ela canta o tema “Lonely Carousel”, nesse disco. E fiquei com vontade de ouvir melhor os discos dos Portishead.

Agora, que saiu o terceiro, exactamente chamado “Third”, fiz uma revisão da matéria e posso dizer que gosto, mas em doses pequeninas, como um bom whisky. Ontem, por exemplo, decidi ouvir os três discos de enfiada e sobrevivi com alguma dificuldade. Tanta melancolia deixa um gajo deprimido!…

“Seventh Tree”, dos Goldfrapp

goldfrapp_seventh.jpgEstes são os Goldfrapp de “Felt Moutain” e gosto mais deles assim.

Este 4º disco da dupla não é tão inspirado como o disco de estreia, mas também é agradável de ouvir: melodias tranquilas, bem servidas pela voz da menina e com arranjos competentes do homem dos sete instrumentos que a acompanha.

Nos dois discos anteriores, “Black Cherry” e “Supernature”, Alison Goldfrapp armou-se em estrela sexy da pop electrónica.

Agora, com este “Seventh Tree”, voltou í s origens. Por seu lado, Will Gregory, desdobra-se nos multi-instrumentos do costume, dando, ao disco, o tom bucólico do primeiro.

Nada de extraordinário, mas agradável.

“In Rainbows”, dos Radiohead

rainbows.jpgJá está í  venda o novo disco dos Radiohead, o tal que esteve disponível no respectivo site, para download, a troco do “que quiserem dar”. Apesar disso – ou, por isso mesmo – o disco está no primeiro lugar no top de vendas, pelo menos nos EUA.

Já o ouvi duas vezes e parece-me mais do mesmo, uma espécie de “Hail to The Thief” um pouco mais desenvolvido. O líder da banda, o Sr. Yorke, vai desenvolvendo a sua personalidade esquizóide, através de canções com melodias obsessivas, repetitivas, umas mais apelativas do que outras. Por vezes, parece que o tipo faz de propósito para complicar o que é simples, enredando as frases musicais, voltando atrás, repetindo o que já disse. Umas vezes resulta, outras vezes começa a ser chato.

Na faixa “Bodysnatchers”, Yorke diz, por exemplo: “I am trapped in this body and can’t get out” e esta frase parece resumir todo o disco – o homem está preso dentro dele próprio e não sabe como sair dali. Será que quer mesmo sair dali? Ou será que lhe dá jeito ter este ar de deprimido-esquizofrénico-drogado-que-não-tem-onde-cair-morto?

rainbows2.jpgBasta ver como as letras das canções estão impressas no livrinho que acompanha o disco. É mesmo para ninguém ler…

Onde está o good old rock’n’roll?

travelwilbury.jpgVem esta nostalgia a propósito de um disco que me ofereceram neste Natal – um duplo álbum que reúne os dois discos editados pelos Travel Wilburys, uma banda de rock formada por dois notáveis falecidos, George Harrison e Roy Orbison, e mais três figuras: Bob Dylan, Tom Petty e Jeff Lynne. Esses discos foram editados, originalmente, em 1988 e 1990, muito tempo depois dos tempos áureos de Harrison e pouco antes da morte de Orbison. Se calhar, as canções contidas nesses dois álbuns não são lá muito originais, os acordes são sempre os mesmos – mas com que alegria aqueles cinco gajos atacam cada um dos temas, contrastando com esta depressão esquizóide do Yorke, que chega a exasperar.

Em resumo: não me importo de ouvir, todos os dias, os Travel Wilburys a cantar “everybody’s got somebody to lean on/ put your body next to mine and dream on”, na cantiga “Handle with care”… já para escutar Tom Yorke a cantar estas melopeias repetitivas de “In Rainbows” é preciso estar com pachorra, que nem sempre se tem…

Ai pode, pode…

Posso ouvir, em meia hora, o seguinte: “Vibe Boogie” (Lionel Hampton), “Autoharp” (Hooverphonic), “I Have Not Been to Oxford Town” (David Bowie), “Glorious Pop Song” (Skunk Anansie), “Lonesome Road” (Stan Kenton), “Hurricane Eye” (Paul Simon) e “Suzie Q” (Creedence Clearwater Revival)?

Ai posso – no meu iPod.

Já lá estão 11 107 músicas e ainda tenho 40 gigas livres.

É chegar a casa, ligar aquele pequeno rectângulo branco e deixar que seja ele a escolher aleatoriamente a música que vou ouvir. Agora, por exemplo, o B.B. King está a acabar o seu “Outside Help”, ao vivo, em Kansas City, em 1972 e, já a seguir, os Stones atacam “Thief in the Night”.

Grande invenção, esta!

“23rd & Stout” – Chuck E. Weiss

chuckweiss.jpgO Sr. Weiss anda nisto há muitos anos, embora não pareça. Começou como baterista, em Denver e acompanhou grandes nomes dos blues e do jazz, durante as décadas de 60 e 70. í€s tantas, foi parar ao Tropicana Motel, em West Hollywood, onde conheceu Tom Waits e gravou um álbum, salvo erro, em 1981.

Depois, deve ter-se distraído com coisas mais importantes, das quais apenas posso suspeitar, olhando para a sua fotografia, no interior do cd.

Cerca de 13 anos depois, lançou outro álbum e, no ano passado, este “23rd & Stout”, que tem uma espécie de subtítulo: “Deranged Detective Mysteries”.

Diz Weiss: “if you ask me why I recorded this album and I would tell you «because it was the wrong thing to do»”.

Permitam-me discordar.

O álbum é óptimo e, embora a influência de Tom Waits seja evidente em algumas faixas, sobretudo a percussão “desorganizada”, Weiss mantém uma performance «cool» e «jazzy», que Waits já perdeu há uns anos. Além disso, os dotes vocais de Weiss são muito mais versáteis, sendo capaz de soar como um “crooner” country, um hispânico bebâdo, um louco rouco ou, até, fazer falsetes credíveis (mais ou menos…)

Aconselho a faixa “No vale nada (porque no m’importa)” para quem, como eu, tem algumas saudades do “velho” Tom Waits, do tempo em que ele não era tão consensual, no que diz respeito í  chamada “crítica intelectual”.

“Gypsy Punks” – Gogol Bordello

gogol.jpgGogol Bordello é um grupo de oito alucinados, que combinam elementos de punk, música cigana e ambiente de cabaret brechtiano.

O líder da banda, Eugene Hutz, é ucraniano e deixou o seu país após o desastre de Chernobyl. Foi refugiado na Polónia, Hungria, íustria e Itália e, desde 1993, em Nova Iorque.

Foi nesta cidade que se juntou a mais uns quantos emigrantes de leste e formou este bizarro Gogol Bordello.

“Gypsy Punks” parece saído da banda sonora de um filme de Kusturika, mas mais arrocalhado. A velocidade é sempre a abrir.

A voz rouca de Hutz canta, na faixa “60 Revolutions”: “I’m gathering New generation/ That’s gonna stand up to it/ Toi this karaoke dictatorship/ Where posers and models with guitars/ Boogie to the shit for beats/ I make a better rock revolution/ Alone with my dick!”

Este é o terceiro disco dos Gogol Bordello e foi editado em 1005. Fiquei com vontade de conhecer os dois anteriores

“Orphans”, de Tom Waits

tomwaits_orphans.jpgUm triplo álbum de Tom Waits é uma grandíssima prenda de Natal. Tem um subtítulo: “Brawlers, Bawlers, Bastards”, que é como quem diz: vociferadores, amotinadores e bastardos.

O subtítulo está bem aplicado. O primeiro disco (Brawlers) reflecte as últimas tendências de Waits; o homem grita, vocifera, usa e abusa da sua voz rouca, enquanto, ao fundo, os instrumentos, todos com som esquisito, fazem a chinfrineira ordenada do costume. São assobios (da responsabilidade de Anges Amar), sinos de vaca e seixos (Bobby Baloo), baixos (Seth Ford-Young e Larry Taylor), guitarras (Joe Gore e Marc Ribot), harmónica (Charlie Musselwhite), bateria (Casey Waits, o filho do chefe). Tudo misturado, soando como uma banda embriagada e apenas vagamente afinada. Inclui uma raridade – “Sea of Love”, tema do filme interpretado por Al Pacino.

O segundo disco (Bawlers) aproxima-se mais dos tempos mais “calmos” (?) de Tom Waits, tipo “Swordfishtrombones” e “Rain Dogs”. Gosto mais deste Tom Waits. Muitas faixas têm o piano ou a guitarra, como instrumento básico, as percussões são mais discretas, há sopros e acordeão, e a loucura parece controlada. Os condimentos são os habituais: valsinhas, histórias cantadas, temas vagamente country.

O terceiro disco (Bastards) é uma brincadeira. Embora comece com uma outra raridade (“What keeps mankind alive”, do disco de homenagem a Kurt Weill e Bertolt Brecht), continua com historinhas contadas por Waits, que devem ser muito engraçadas, porque o homem dá algumas gargalhadas; o problema é que não consigo perceber metade do que ele diz.

Em resumo: 54 temas de Tom Waits num único álbum! É um fartar vilanagem!

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