Não sei se a Ana Jorge se lembra de mim. Chegámos a ser colegas, no H. D. Estefânia e já nos cruzámos várias vezes no H. Garcia de Orta.
Se calhasse falar com ela neste momento, em que acaba de ser nomeada ministra da Saúde, gostaria de lhe dar algumas dicas.
E quem sou eu para dar conselhos í ministra da Saúde?
Bom, sou um colega, médico há 30 anos, médico de família há 23 anos, trabalhando num Centro de Saúde situado junto a três bairros sociais multi-étnicos, Centro de Saúde esse que faz cerca de 80 mil consultas por ano, com apenas 10 médicos.
Como médico, tenho estado sempre presente nas várias reformas dos Cuidados Primários, desde o Serviço Médico í Periferia ao Projecto Alfa e ao RRE. Agora, a Unidade de Saúde onde trabalho foi aprovada como USF, modelo B.
Portanto, penso não ser pretensiosismo dar-lhe os seguintes conselhos:
As Unidades de Saúde Familiares poderão ajudar a resolver o principal problema dos Cuidados Primários de Saúde: os utentes sem médico de família; poderão, também, responder melhor í s necessidades das populações, evitando idas aos SAP.
No entanto, para que as USF resultem não podem continuar a estar sujeitas ao regime de voluntariado. No concelho onde trabalho, existem 5 USF e 7 Extensões de Saúde que nunca irão aderir a esta reforma. Para quê? O que poderá levar médicos na casa dos 50 anos a embarcar em mais uma reforma, sujeitando-se a ver o seu trabalho avaliado por outros colegas, se podem continuar na sua rotina?
Correia de Campos conseguiu 100 USF em ano e meio. A esta velocidade, a minha geração de médicos atinge a idade da reforma antes da reforma dos CSP estar concluída!
Além disso, a actual reforma pode levar í distinção entre utentes de primeira (os que têm a “sorte” do seu médico de família fazer parte de uma USF) e utentes de segunda (aqueles cujo médico não aderiu a nenhuma USF ou os que nem médico de família têm…).
Não consigo perceber como é que o Ministério da Saúde convive bem com o seguinte: é exigido í s USF, modelo B, que registem as hemoglobinas glicosiladas dos seus doentes com diabetes; se, pelo menos, 80% desses doentes tiverem esse valor registado nos últimos três meses, haverá lugar ao pagamento de um incentivo. Parece-me correcto. Estimula os médicos a pedirem e registarem a análise que mais diz sobre o controlo da doença.
E quanto í s restantes Unidades de Saúde que não são USF, e que são a maioria – nessas, o registo das hemoglobinas glicosiladas já não tem importância?
De facto, passam a existir utentes de primeira e utentes de segunda – e com a agravante de não poderem escolher.
Portanto, o que há a fazer é generalizar algumas das regras das USF, e transformá-las em lei, a saber:
1. Os médicos de família passam a ter listas de, no mínimo, 1800 utentes, em vez dos actuais 1500.
2. Os vencimentos da equipa de saúde (médicos, enfermeiros e administrativos) passam a estar indexados í s listas de utentes ponderadas (é muito diferente gerir uma lista de idosos ou gerir uma lista onde predominam os jovens adultos).
3. Haverá incentivos sempre que sejam cumpridos os indicadores previamente contratualizados (número de gravidezes, consultas de Planeamento Familiar, taxa de cobertura, etc).
4. Os indicadores serão avaliados de forma ágil e simples, através dos registos informáticos, pelo que serão escolhidos indicadores fáceis de avaliar desta maneira. Isto quer dizer que não serão necessárias grandes equipas de “cientistas” para fazer essas avaliações – por outras palavras, sobram mais médicos para o terreno. A propósito: quantos médicos de família estão, neste momento, integrados nas comissões, subcomissões e outras coisas acabadas em “ões” e que, por conseguinte, não fazem consultas?
5. Os vários elementos da equipa de saúde intersubstituem-se nas ausências por doença, férias ou formação, só havendo lugar a horas extraordinárias quando houver uma ausência inesperada superior a duas semanas.
6. Todas as Unidades de Saúde que tenham dimensão suficiente, terão que estabelecer escalas de modo a que possa haver uma resposta í s doenças agudas, das 8 í s 20 horas, todos os dias úteis.
7. Aos sábados, domingos e feriados, as diversas Extensões de Saúde de uma mesma região, deverão organizar-se, de modo a oferecerem resposta í s situações de doença aguda, em rotatividade.
São apenas 7 dicas.
Li algures, num jornal desta semana, que a nova ministra da Saúde teria “sensibilidade e bom senso” na condução da política de saúde.
Espero bem que sim.
Mas não quero deixar de acrescentar que as reformas feitas pelos próprios profissionais tendem, muitas vezes, a esquecer que o objectivo dessas mesmas reformas deve ser o utente, e não o profissional.
Concordo com tudo o que está escrito acima…..mas antes de assinar de cruz agradecia que me fosse dado uma resposta muito honesta….í pergunta …QUEM LIMITOU A ENTRADA DE ALUNOS EM MEDECINA ? e QUANDO OS CURSOS DE 77 , 78 , 79 , FOREM PARA A REFORMA COMO REDESTRIBUIEM OS UTENTES? …PASSAM A SER LISTAS DE 3000 UTENTES POR MÉDICOS ? …
bem se no País todos trabalhassem em igualdade de produtividade como os médicos em geral trabalham ( quer na função pública como privada ) de certeza não estavamos assim de ” tanga”….e muita coisa fica por dizer….