Crime í  americana

Notícia do Público de ontem:

“Uma jovem de 15 anos dos EUA está a ser acusada do crime de pornografia infantil, por ter enviado a colegas de escola, via telemóvel, fotografias suas em que aparece nua.”

Outras possibilidades:

Casal sado-masoquista acusado de violência doméstica.

Pai acusado de pedofilia ao ser apanhado a dar muitos beijinhos í  sua filha, em pleno Centro Comercial.

Mãe acusada de exibicionismo por tomar banho de imersão com o filho.

Irmão preso por lenocínio, ao dar o número de telemóvel da irmã mais velha a todos os colegas da escola.

Homem acusado de assassínio depois de se ter suicidado com tiro na cabeça.

A crise financeira explicada í s crianças

Era uma vez um país muito grande e muito rico, chamado Estados Unidos da América, governado por um senhor chamado Bush, que, em português, quer dizer arbusto, embora também possa designar o conjunto de pêlos que as pessoas mais crescidas têm, í  volta da pilinha ou do pipi.

Esse país, porque era muito grande, tinha muito espaço para construir casas, que também eram muito grandes. Então, os americanos (assim se chamavam os habitantes desse país, embora também houvesse alguns chamados John, Michael, Betty, Sarah, Barak, Bill, Monica, etc) desataram a construir casas. Mas, para o poderem fazer, tiveram que pedir dinheiro emprestado aos Bancos.

Eu escrevo Bancos com letra grande, para vocês não confundirem com os bancos onde a gente se senta, claro.

Ora, os banqueiros – que são os donos dos Bancos – emprestam dinheiro a juros. E o que é que isto quer dizer? Quer dizer que tu pedes, por exemplo, 1 euro emprestado a um amigo, para comprares pastilhas elásticas e, depois, tens que lhe pagar 1 euro e meio.

E perguntas tu: mas por que raio é que eu tenho que dar um euro e meio ao gajo, se ele apenas me emprestou um euro?

E eu respondo-te: é o capitalismo, ó ranhoso!

Se não estás bem, muda-te! Quando tiveres direito ao voto, vota no PCP que, lá para 2040 ainda há-de continuar a lutar pelo pleno emprego, pelo aumento salarial das classes trabalhadoras e pela nacionalização dos meios de produção.

Bom, mas voltemos ao tal país muito grande…

Portanto, os banqueiros emprestavam dinheiro com juros ao americanos e estes construiam casas, que depois vendiam a outros americanos que, por sua vez, para as poderem comprar, pediam dinheiro emprestado aos Bancos.

í€s tantas, alguns Bancos já não tinham mais dinheiro para emprestar mas, como não queriam perder os clientes, pediram dinheiro emprestado a Bancos mais ricos, – e assim sucessivamente, até ao Infinito.

Estava tudo a correr muito bem: os americanos compravam e vendiam casas uns aos outros, que é uma coisa que os americanos gostam muito de fazer, e os banqueiros estavam cada vez mais ricos, tinham grandes ordenados e passavam férias em sítios formidáveis.

Só que, certo dia, alguns americanos deixaram de pagar o que deviam aos Bancos. E, depois, mais americanos fizeram o mesmo. E mais, e mais. Até que os Bancos mais pequenos começaram a ficar sem dinheiro e deixaram, também eles, de pagar aos Bancos mais ricos – e assim sucessivamente, até ao Infinito.

Moral da história: se quiseres uma pastilha elástica e não tiveres dinheiro para a comprar, não peças dinheiro emprestado – rouba-a!

Marxismo, tendência Bush

Admiro o homem!

Enganou-me bem enganado!

Quem diria que um republicano que acredita no Criacionismo é, afinal, um marxista convicto?!

Bom, claro que George Bush não é um marxista ortodoxo. Não acredito que tenha sequer lido um resumo de “O Capital”. Mas alguém lhe deve ter dado umas luzes sobre a teoria marxista e Bush ficou fã.

Depois, é claro, teve que pensar sobre o assunto – e todos sabemos como é difícil um Bush pensar, e este George ainda é pior que o pai.

Bush ruminou sobre as ideias de Karl Marx durante anos mas, na primeira oportunidade – pimba! – atacou os capitalistas!

E aí está ele a propor que o povo norte-americano tome de assalto os Bancos e as Seguradoras. Os capitalistas não souberam gerir os grupos financeiros, foram gananciosos e garganeiros? O povo, liderado por George Bush, toma conta dos meios de produção de notas e moedas.

Capitalista, escuta – George Bush está em luta!

E por essa Europa fora, outros marxistas perdem a vergonha e saem do armário. Os governos inglês e belga até já nacionalizam bancos!

Pobre Vasco Gonçalves, pobre companheiro Vasco, que já não está entre nós para assistir a esta verdadeira revolução!

Espero que George Bush não fique por aqui. Depois de retirar os bancos e as Seguradoras das garras dos capitalistas e de as devolver ao povo, é imperioso que avance logo para a Reforma Agrária e comece a distribuir as grandes herdades pelos camponeses, seguindo-se a urgente nacionalização da McDonald’s, da Coca-Cola e da Starbucks.

LONGA VIDA AO CAMARADA GEORGE BUSH!

OS ESTADOS UNIDOS JAMAIS SERíƒO VENCIDOS!

“Este País Não É Para Velhos”, de Cormac McCarthy

estepais.jpgDecidi ler o livro antes de ver o filme. Quando vejo o filme primeiro, fico com pouca vontade de ler o livro. Regra geral.

Gostei muito do outro livro que li de McCarthy, “A Estrada”. Considerei-o, mesmo, um dos melhores livros dos últimos tempos. Por isso, fiquei um pouco desiludido com este “No Country For Old Men”, publicado em 2005.

É um livro árido, com uma história muito simples, violência a rodos e um xerife que gosta de filosofar. Há páginas inteiras de diálogos, aparentemente desnecessários, fazendo lembrar os diálogos de “Pulp Fiction”

Exemplo:

“Arrombas cofres, é?
Se eu arrombo cofres?
Isso.
Como é que essa ideia te passou pela cabeça?
Não sei. És um arrombador de cofres ou não?
Não.
Bom, alguma coisa tens de ser. Certo?
Toda a gente é alguma coisa.
Alguma vez estiveste na Califórnia?
Sim. Já estive na Califórnia. Tenho um irmão a viver lá.
E ele gosta daquilo?
Não sei. Vive lá.
Mas tu não eras capaz de lá viver, pois não?
Não.
Achas que é para lá que eu devo ir?”

E assim sucessivamente. Gosto destes diálogos mas, í s tantas, farta um bocado. Outra técnica que McCarthy usa e abusa, neste livro, é a da utilização da conjunção copulativa.

Exemplo:

“Pí´s a mão em concha e varreu o troco de cima do balcão para a palma da outra mão e guardou as moedas no bolso e deu meia volta e dirigiu-se para a porta.”

Até parece que McCarthy estava já a pensar no argumento para um filme…

“Por Aqui e Por Ali”, de Bill Bryson

bryson_walk.jpgInvejo o Bill Bryson, a quem pagam para viajar. Depois, ele “só” tem que escrever um livro sobre isso.

Este chama-se “A Walk in the Woods” mas, mais uma vez, o responsável pela edição portuguesa achou o título pateta e decidiu chamar-lhe “Por aqui e Por Ali”.

Bryson publicou o livro em 1997 e nele conta as suas caminhadas pelo trilho dos Apalaches, que vai desde a Geórgia ao Maine, atravessando as Carolinas, a Virgínia, a Pensilvânia, um pouco de Nova Iorque, e depois o Massachussets, o New Hampshire e Vermont. São mais de 3300 km, dos quais Bryson “apenas” percorreu 1400, por vezes sozinho, outras vezes acompanhado pelo seu amigo Katz.

Sempre com muito humor e com preocupações ambientais quanto baste, sem entrar em histerias, Bryson vai-nos descrevendo as suas longas caminhadas por uma das maiores florestas do planeta, ao longo das montanhas dos Apalaches (mais de 350 picos com mais de 1500 metros de altitude). O Trilho dos Apalaches é o mais antigo e longo do mundo, e ficou concluído em 1937.

Um daqueles livros que sabe bem ler com companhia. E um tipo fica logo com vontade de tentar percorrer, pelo menos, uma parte desse trilho.

“Notas sobre um país grande”, de Bill Bryson

notassobrepais.jpgLer um livro de Bryson é divertimento garantido. Conhecido como escritor de viagens, este norte-americano tem sentido de humor europeu e enriquece sempre a sua prosa com um estilo divertido.

Neste livro, Bryson juntou as crónicas que escreveu, semanalmente, para a revista inglesa Mail on Sunday’s Night and Day.

Depois de viver muitos anos na Grã-Bretanha, Bryson mudou-se com a família para os EUA e, nestas crónicas, fala-nos da América como se fosse um estranho em terra estranha.

Exemplos:

Sobre a mania que os americanos têm de colocar avisos por todo o lado: “a piscina pública local tem trinta e sete avisos afixados – tinta e sete! – sendo o meu preferido o que diz: «Em cada mergulho apenas é permitido um pulo no trampolim.»

Sobre a importância que os americanos dão ao facto de os carros terem suportes para copos: “faz pouco tempo, o New York Times apresentou um longo artigo sobre os testes que realizou a uma dúzia de carros familiares. Classificou-os de acordo com 10 tópicos, tais como motor, tamanho, espaço no porta-bagagens, comportamento na estrada, qualidade da suspensão e, pois é, número de suportes de copos. (…) Alguns carros, tais como o Dodge Caravan, vêm com 17 suportes de copos! Dezassete! O maior Caravan leva até sete pessoas. Não é preciso ser um físico nuclear, ou até estar bem acordado, para ver que isso dá 2,43 suportes por passageiro. É legítimo que se pergunte porque necessitaria cada passageiro do veículo de 2,43 suportes.”

Sobre a preocupação dos americanos pelos estilos saudáveis de vida: “todas as pessoas que conheço, quase não bebem, nunca tocam em cigarros, vigiam o colesterol como se fossem seropositivos, vão e voltam a correr daqui ao Canadá duas vezes ao dia e vão para a cama cedo. Tudo isto é muito ponderado, e sei que vão viver muito mais do que eu, mas não é lá muito divertido”.

Sobre a informática: “durante muito tempo espantava-me como é que algo tão caro, tão de vanguarda, podia ser tão inútil, e então ocorreu-me que um computador é uma máquina estúpida com capacidade de fazer coisas incrivelmente inteligentes, enquanto os programadores informáticos são pessoas inteligentes com capacidade de fazer coisas incrivelmente estúpidas. Formam, em suma, um par perigosamente perfeito.”

Sobre os políticos americanos e a pena de morte: “não acredito que haja um político na América – certamente nenhum com algum estatuto – que tivesse coragem de enfrentar um sentimento geral desta magnitude (57 por cento dos americanos continuariam a ser favor da pena de morte, mesmo se se descobrisse que um pessoa em cada cem tinha sido executada indevidamente). Tempos houve em que os políticos tentavam mudar a opinião pública. Agora limitam-se a responder a ela, o que é lamentável, porque estas coisas são imutáveis.”

Publicado em 1998, a edição portuguesa, da Quetzal, é deste ano; a tradução é de Miguel Conde.

“Made in America”, de Bill Bryson

madeinamerica.jpgNeste calhamaço de quase 600 páginas, publicado em 1994, Bryson apresenta-nos a História informal da América. A sua leitura ajuda quem, como eu, por lá andou há pouco tempo, a compreender algumas das idiossincrasias desse imenso país que, apesar de ser uma manta de retalhos, não deixa de ter uma verdadeira unidade nacional.

São vinte um capítulos que abrangem a História não oficial dos EUA, desde o Mayflower í  era espacial, com um enfoque muito especial na língua inglesa, tal como ela é falada pelos americanos.

No capítulo “Nomes”, Bryson conta que, quando a linha férrea estava a ser instalada no estado de Washington, em 1870, um dos vice-presidentes da companhia teve como tarefa dar nome a 32 novas comunidades que iam nascer, ao longo da linha. E então “deu nomes í s comunidades de tudo e mais uma alguma coisa, desde poetas (Whitier) e peças de teatro (Othello), a tipos de comida caseira (Ralston e Purina).”

Verifiquei isso mesmo, ao atravessar o South Dakota, o Iowa ou o Wyoming e ao deparar em localidades com nomes como Gillette, Atomic City, Montpelier, Alcova, Dinossaur, Eureka, Medicine Bow, Ten Sleep.

Fiquei também a saber (embora já suspeitasse), que a maior parte dos mitos sobre os tempos dos cowboys foram inventados por Hollywood. Por exemplo, aquela história das caravanas dos colonos se disporem em círculos, para melhor se defenderem dos ataques dos índios, é uma aldrabice. Diz Bryson: “durante a maior parte da viagem as carroças avançavam em filas paralelas com distâncias entre si que podiam ir até 15 quilómetros, a fim de evitar a poeira umas das outras e também os sulcos das rodas daqueles que tivessem por ali passado antes deles – o que criava mais um obstáculo í  formação do tal círculo defensivo”.

No que respeita í  comida americana, é verdade que ele não presta, mas também é verdade que os próprios americanos parecem ter vergonha dela, ao inventar nomes estrangeiros para coisas que eles inventaram.

Diz Bryson: “O Russian dressing é desconhecido pelos russos, assim como a variedade americana de French dressing é desconhecida para os franceses. A vichyssoise não foi criada em França mas em Nova Iorque, em 1910, e o queijo Liederkranz não veio da Alemanha, nem sequer da íustria ou da Suíça, mas de Monroe, em Nova Iorque, onde foi criado em 1892. Em Espanha, o chilli com carne era desconhecido até ao momento em que foi lá introduzido pelo Novo Mundo. Salisbury steak não tem nada a ver com a cidade inglesa famosa pela sua catedral (foi chamado assim por um americano – o Dr. J. H. Salisbury), nem o Swiss steak tem o mais pequeno pedigree alpino. Chop suey (baseado no cantonês para ‘miscelânea’) surgiu pela primeira vez em San Francisco nos finais da década de 1800 (e não na China). O bolinho da sorte foi criado em Los Angeles na segunda década do século XX. Ainda mais recente é o chow mein, que apareceu em 1927.”

Uma das características mais marcadas dos americanos parece ser transformar a mais pequena novidade numa verdadeira mania, e fazê-lo de tal maneira, que suplantam sempre todos os restantes povos. Os exemplos são inúmeros, ao longo do livro, desde os patins aos centros comerciais. Bryson diz-nos que, assim que a bicicleta atravessou o oceano e se instalou na América, por volta de 1882, os americanos aderiram de tal forma í  novidade que, em 1895, existiam cerca de dez milhões de bykes nos EUA.

Byke” é um dos milhares de termos novos, introduzidos na língua inglesa, graças aos americanos, que têm uma predilecção especial por abreviar palavras. Os exemplos são, também, aos milhares, desde “vic“, em vez de victim, até “fab“, em vez de “fabulous“. Outra coisa de que eles gostam muito é de usar neologismos, a partir de siglas, mesmo com os palavrões. Bryson dá alguns exemplos: tuifu (the ultimate in fuck-ups), tarfu (things are really fucked up), fubar (fucked-up beyond recognition), e fubid (fuck you, buddy, I’m detached).

O dinheiro, a imigração, as viagens, a comida, as compras, a educação, a publicidade, o cinema, os desportos, a política e a guerra, o sexo – são outros tantos assuntos escalpelizados exaustivamente por Bill Bryson, neste livro essencial para quem quiser conhecer melhor os EUA, os seus tiques e as suas manias.