“Nexus”, de Yuval Noah Harari (2024)

Mais um calhamaço de cerca de 600 páginas deste historiador e filósofo (Israel, 1976), que atingiu o patamar de guru depois das suas obras anteriores: Sapiens, Homo Deus e 21 Lições para o Século XXI.

Neste livro, Harari faz uma “História breve das redes de informação – da Idade da Pedra à Inteligência Artificial”, como diz o subtítulo.

O autor fala-nos das tábuas egípcias, dos pombos correios (um deles até figura na capa, do telégrafo, da prensa de Gutemberg, dos jornais, rádio e televisão, enfim das mais variadas redes de informação que o homem foi criando e controlando. A inteligência artificial será a primeira rede de informação que poderá fugir ao controlo do homem. E isso será bom ou será mau? Ninguém sabe. Por enquanto.

Poderia citar muitos parágrafos. Fiquemo-nos por estes (e já são muitos):

Pág. 57

“Uma «marca» é um subtipo de história. Trata-se de um rótulo aplicado a um produto, que conta uma história sobre ele. Pode ter pouco que ver com as especificidades do produto, mas, ainda assim, o público habitua-se a associar um ao outro. Por exemplo, há décadas que a Coca-Cola vem investindo dezenas de milhares de milhões de dólares em campanhas publicitárias que nos contam e recontam a história da Coca-Cola. O público viu e ouviu essa narrativa tantas vezes que muitos passaram a associar esse preparado – afinal, uma variedade de água com sabor – a diversão, felicidade e juventude (em lugar de cáries, obesidade e resíduos de plástico). Eis o propósito de uma marca.”

Pág. 74:

“Neste aspecto, a Constituição dos Estados Unidos da América diferenciou-se das narrativas que negavam a sua natureza fictícia e chamavam a si a origem divina, como é o caso dos Dez Mandamentos. À semelhança daquele texto constitucional, também os Dez Mandamentos sancionaram a escravatura. Reza do Décimo Mandamento: «Não cobiçarás a casa do teu próximo; não cobiçarás a mulher do teu próximo nem o seu servo ou a sua serva». Deduz-se daqui que Deus não vê nenhum impedimento a que as pessoas tenham escravos, objectando apenas a que se cobicem os escravos do próximo. Porém, ao contrário da Constituição dos EUA, os Dez Mandamentos não estão equipados com um mecanismo de autocorrecção. Não se lê, num Décimo Primeiro Mandamento: «Poderás emendar quaisquer destes mandamentos, bastando-te para isso o apoio de dois terços dos votantes»”

Pág. 123:

“A Bíblia diz que não devemos trabalhar ao sábado. Porém, não nos esclarece sobre o que é «trabalho». Pode regar-se um terreno cultivado? As plantas nos vasos? Pode levar-se água às cabras? Pode ler-se um livro ao sábado? E escrever um livro? E rasgar um papal? Os rabinos decidiram que ler um livro não é trabalhar, mas que rasgar um papel é trabalho, daí que, na actualidade, os judeus ortodoxos separem antecipadamente tiras de papel higiénico para usarem ao sábado”

Pág. 262

“Quando um banco central sobe as taxas de juro de referência 0,25 pontos percentuais, que impacto tem isso na economia? Quando a curva de rendimentos dos títulos de dívida pública sobre, é boa altura para os comprarmos? Em que momento é aconselhável reduzir o preço do petróleo? Tratando-se da área financeira, eis o tipo de perguntas importantes a que os computadores já conseguem responder melhor do que a maioria dos humanos. Não admira, portanto, que os computadores venham assumindo uma fatia cada vez maior das decisões financeiras de todo o mundo. Poderemos mesmo chegar a um ponto em que os computadores dominarão os mercados financeiros e inventarão ferramentas financeiras que estarão além da nossa capacidade de compreensão”

Pág. 289

“Surgindo e desenvolvendo-se as redes burocráticas centralizadas, entre os vários papéis dos burocratas, um dos mais importantes era a vigilância da população. No Império Qin, os funcionários públicos tratavam de saber quem pagava impostos e quem planeava a insurgência. Já a Igreja Católica queria saber se pagávamos dízimo e se nos masturbávamos. A Coca-Cola queria saber como nos podia convencer a comprarmos-lhes os produtos. Governantes, padres e negociantes quiseram descobrir os nossos segredos, usando-os para nos dominar e manipular”.

Recomendo.