“Um cisne selvagem e outros contos”, de Michael Cunningham (2015)

O autor de As Horas decidiu reescrever alguns contos de fadas e duendes e saiu-se muito bem.

cisne celvagemEste Um Cisne Selvagem, com ilustrações de Yuko Shimizu, lê-se de uma penada e sempre com um sorriso nos lábios.

í€ medida que vamos lendo as histórias, vamos reconhecendo as personagens e os truques de fantasia que conhecemos na infância: a Bela Adormecida, a Bela e o Monstro, as maçãs envenenadas, o feijoeiro mágico, os gigantes, os anões e as bruxas.

São onze pequenos contos, que terminam com um felizes para sempre, como todas as histórias de encantar.

Vale a pena.

“A Rainha da Neve”, de Michael Cunningham (2014)

Parece-me que Michael Cunninham perdeu o “magic touch” que o fez ganhar o Pulitzer com o romance As Horas (1998), e que o fez escrever outros dois grandes romances: Sangue do meu Sangue (1995) e Uma Casa no Fim do Mundo (2001).

Já o anterior Ao Cair da Noite  (2010) me pareceu maçador, bem como Dias Exemplares (2005).

rainha da neveEste novo romance de Cunningham tem o cenário habitual: uptown Manhattan, personagens ligeiramente marginais, artistas, famílias diferentes.

A história desenrola-se em volta de um compositor (pop? rock? folk? não se percebe…), Tyler, da sua companheira Beth, que sofre de cancro terminal, do seu irmão homossexual Barrett e de alguns amigos. Todos têm muitas dúvidas quanto ao sentido da vida, todos snifam coca, Barrett viu uma luz no céu do Central Park e acha que aquilo é um presságio, Tyler casa-se com Beth um pouco antes dela morrer, mas também se sente atraído por Liza, uma cinquentenária que só namora com rapazes muito mais novos e tudo isto é muito pouco consistente.

Pelos vistos, o êxito dos três primeiros romances não foram um bom augúrio.

“Ao Cair da Noite”, de Michael Cunningham

—Michael Cunningham tornou-se um dos meus escritores contemporâneos preferidos, graças a “Uma Casa no Fim do Mundo” (1990), “Laços de Sangue” (1995), “As Horas” (1998) e “Dias Exemplares” (2005).

No entanto, este “Ao Cair da Noite” desiludiu-me um pouco.

A acção decorre em Manhattan e a história é muito “classe média-alta-intelectual-nova iorquina”, como se fosse um filme do Woody Allen dos anos 80, mas sem as piadas.

Peter Harris é dono de uma galeria de arte e a mulher, Rebecca, é directora de uma revista de arte. No final do dia, o casal quarentão encontra-se no seu confortável apartamento e bebe um copo de vinho tinto, antes de encomendar o jantar tailandês ou indiano.

Tudo parece correr quando o irmão mas novo de Rebecca vem instalar-se no apartamento e, certo dia, Peter o vê, todo nu, com o seu corpo magro e musculado de ainda quase adolescente.

A partir daí, Peter vai começar a duvidar da sua sexualidade. Perplexo, pergunta-se a si próprio como é possível ter tido sempre comportamentos heterossexuais e, agora, de repente, sentir-se atraído por uma pessoa do mesmo sexo, ainda por cima, irmão da sua esposa.

Revê o seu passado e começa a encontrar indícios de anteriores impulsos que terão sido reprimidos. Recorda a história trágica do seu irmão mais velho, homossexual, e que morreu com sida.

A segunda metade do livro é toda preenchida com esta luta interior de Peter e com jogos de sedução entre ele e o irmão de Rebecca.

No entanto, nada acontece, para além de um beijo…

Confesso que a história não me tocou, como as dos anteriores romances de Cunningham. Claro que ele não sabe escrever mal, e a história deste “By the Nightfall” está bem contada, mas não chegou para me emocionar.

“Dias Exemplares”, de Michael Cunningham

diasexemplares.jpgDepois de ter lido os outros romances de Cunningham (“Uma Casa no fim do mundo”, 1990; “Sangue do meu sangue”, 1995; e “As Horas”, 1998), confesso que esperava mais deste “Dias Exemplares” (“Specimens Days”, 2005).

O livro está dividido em três partes: “Dentro da máquina”, passado nos finais do século XIX ou princípio do século XX, em plena Era Industrial; “A Cruzada das crianças”, que decorre na actualidade; e “Uma Espécie de beleza”, que se passa num futuro distante, após um qualquer holocausto.

Em comum, estas três histórias têm alguns pontos: todas têm Nova Iorque como cenário, os protagonistas são sempre um homem, uma mulher e um rapaz (embora não o mesmo homem, a mesma mulher e o mesmo rapaz), e os versos de Walt Whitman surgem nos três segmentos, com valor profético.

Qualquer destas três histórias poderia ter dado um bom romance independente. O autor também poderia ter optado por escrever três excelentes “short stories”. No entanto, optou por deixar cada um dos segmentos como que inacabado. Aliás, sobretudo no final da segunda e da terceira partes, fica-se com vontade de continuar a ler, fica-se com vontade de que a história continue.

“Dentro da máquina” foi o segmento que me despertou menos interesse. “A Cruzada das crianças” é uma história muito perturbadora e algo mística. Finalmente, “Uma Espécie de beleza” é um excelente conto de ficção científica, que me fez lembrar algumas coisas que li há muitos anos, na velhinha colecção Argonauta (Ray Bradbury, Philip K. Dick, por exemplo – se calhar, a comparação é blasfema…).

 

Cunningham tem uma escrita muito particular, poética e macia. Parece-me que escreve com ternura. Um exemplo: “Era pequena e bonita, infantil, embora tivesse pelo menos a idade de Catherine. Usava um roupão cor de tangerina. Tinha o aspecto de qualquer coisa que podia ser ganha numa rifa de feira.” Outro exemplo: “A cabeça redonda era demasiado grande para o seu corpo franzino. Assentava sobre os ombros da jaqueta como uma abóbora. Como um desenho da Lua num livro infantil.”

No entanto, repito, esperava mais deste novo livro de Cunningham.