“Sobre o Céu”, de Richard Powers (2018)

Em 2009 li um outro livro deste autor norte-americano (Illinois, 1957), chamado “…O Eco da Memória”. Nesse livro, Powers falava de Grous, neste outro, fala de árvores. De muitas árvores!

“…The Overstory” é o título original. Difícil de traduzir. Poderíamos dizer que overstory se refere í  copa das árvores quando, numa floresta, por exemplo, formam uma espécie de capa.

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Nuno Quintas traduziu este livro e merecia que o seu nome figurasse na capa, tal a dificuldade que deve ter encontrado no seu trabalho. Ele próprio, numa nota, no final do livro, refere essa dificuldade, uma vez que uma boa parte do livro fala das inúmeras espécies de árvores dos Estados Unidos que, muitas vezes, não se encontram no continente europeu, muito menos em Portugal. Pelo contrário, o velho castanheiro que, abnegadamente, nos oferece as deliciosas castanhas nesta época do ano, parece que está extinto nos Estados Unidos, devido a alguma espécie de praga, pelo menos, a julgar pelo livro de Powers.

Vencedor do Pulitzer, achei este romance demasiado confuso. Por um lado, junta diversos protagonistas, diria mesmo protagonistas a mais, mas, no entanto, os verdadeiros protagonistas são as árvores. O livro está dividido em 4 partes: raízes, tronco, copa e sementes.

Nas raízes, ficamos a conhecer as histórias das diversas personagens e é a parte mais interessante do livre, na minha opinião. Depois, a coisa complica-se. Alguns destes personagens unem-se para se tornarem activistas contra o abate de árvores, a coisa complica-se, eles radicalizam-se e, í s tantas, confesso que me perdi no enredo!

Mas o texto é confuso, com referência constante í s diversas árvores (coitado do tradutor, o que ele deve ter sofrido!)

Eis um exemplo:

“…Passado um tempo, consolidam-se: simples, e depois ganham grão. Como na primavera o ácer fica todo corado de cima a baixo. O aplauso educado dos choupos. O teixo a esticar-se, qual progenitor a pegar na mão da prole. O odor das nozes da nogueira-americana quando picadas. Os diques abrem-se e inundam-no de recordações, como os milhões de fechos de luz que atravessam as palmas de um castanheiro-da-índia. O ângulo entre as acácias. A turbulência num pedaço de madeira de oliveira. Os cachos da folhagem da mimosa, feitos caudas de aves tropicais. A escrita secreta, palavras turvas e crípticas, no avesso da casca da bétula. Caminhar debaixo de choupos-negros em que a calam pesa tanto que até inspirar era uma transgressão. Roçar um cipreste e pensar: «deve ser este o cheiro da vida do além»”

Difícil acabar de ler este calhamaço de mais de 400 páginas e ficar a pensar que está um pouco sobrevalorizado.

“O Eco da Memória”, de Richard Powers

—Segundo o New York Times, citado na capa deste livro, Richard Powers «é um génio da literatura moderna. Brilhante e admiravelmente original».

Não sei se será um génio mas, quanto í  originalidade tenho mesmo muitas dúvidas.

A personagem central do livro é um neurologista que, nos últimos anos se tem dedicado a escrever livros em que conta as histórias de doentes neurológicos, daqueles que se esquecem que têm o lado direito do corpo, ou que alucinam vendo crianças, quando olham para a esquerda de um certo modo, ou que esquecem o nome só de certos objectos.

Ora é exactamente isto que Oliver Sacks, por exemplo, faz há muito tempo, nomeadamente no seu livro “O Homem que Confundiu a Mulher com o Chapéu” (1985), ou até mesmo António Damásio, com o seu “O Erro de Descartes”, embora, neste caso, sem a parte ficcional.

Em “O Eco da Memória”, um rapaz do Nebrasca, sofre um grave acidente de viação e entra em coma. Quando recupera, embora não saiba muito bem o que lhe aconteceu, recorda-se de quase tudo, mas é incapaz de reconhecer a irmã e a cadela. É o sindroma de Capgras.

O neurologista é chamado para dar a sua opinião técnica, mas sente-se irresistivelmente atraído por uma ajudante de enfermagem do hospital onde o rapaz está internado. Apesar de ter um casamento longo e bem sucedido, começa a duvidar de si próprio, como homem, como marido e até como médico. Afinal, ele serve-se das desgraças dos outros para fazer fortuna, contando as suas histórias.

Em pano de fundo, o livro vai-nos descrevendo as danças de acasalamento dos grous que, todos os anos, se instalam naquela zona dos Estados Unidos.

Assim, o livro pareceu-me interessante mas não «sem qualquer paralelo entre os nossos romancistas de primeira linha na forma como consegue ligar as novas ambiguidades científicas com as antigas relatividades do coração», como também diz o New York Times.