“The Oldman and the Gun”, de David Lowery (2018)

O filme conta-nos a história de Forrest Tucker (Robert Redford, 82 anos), um crónico assaltante de bancos que, apesar da idade avançada, continua a sua actividade criminosa, com a ajuda de dois cúmplices: Teddy (Dany Glover, 72 anos) e Waller (Tom Waits, 69 anos).

—Baseado numa história verídica, é um filme tranquilo, de acordo com a idade dos actores.

Robert Redford compõe um excelente Tucker, um assaltante bem educado, que nunca levanta a voz, nunca usa a arma que traz consigo e tem sempre um cumprimento e um sorriso para os gerentes dos bancos que assalta.

Tom Waits tem um papel curto, mas conta uma história digna dele próprio.

Sissi Spacek (69 anos) é Jewel, uma viúva que acolhe Tucker durante algum tempo e Casey Affleck (o mais novo deles todos), é o polícia que devia prender o assaltante, mas que, no fundo, o admira.

Bom filme.

“Bad As Me” (2011) – Tom Waits volta a atacar!

Começo por dizer que pode haver conflito de interesses, já que, desde os anos 80 do século passado que Tom Waits é o meu autor-intérprete-performer preferido.

Dito isto, saúdo largamente mais um disco do Tom Waits (dizem que é o 17º, se contarmos só o de originais). Tenho-os todos, claro.

Divido a carreira de Waits em duas fases: antes e depois do seu casamento com Kathleen Brennan.

Antes, Waits era um excelente bluesman, com muita influência do jazz. Atingiu o seu topo, na minha opinião, com a banda sonora de “One From The Heart“, filme de Coppola.

Foi durante as filmagens que Waits conheceu Brennan, que era funcionária da Zoetrope, a empresa produtora de filmes, de Coppola.

A partir da sua união com Brennan, Waits começou a explorar outras sonoridades, enrouqueceu mais a voz, e começou a juntar tangos, valsas, salsas e outras esquisitices ao seu reportório, mantendo, no entanto, os blues como norte. Mais recentemente, o rock acabou por absorvê-lo e até lhe deram um espaço no Hall of Fame.

—Este “Bad As Me” tem 13 novos temas que já ouvi muitas vezes. Quero com isto dizer que, no fundo, Tom Waits está sempre a interpretar os mesmos temas, com os mesmos acordes, mas sempre com novas roupagens.

Quando começamos a ouvir o acordeão de “New Year’s Eve”, ou a percussão e a guitarra de “Get Lost”, dizemos “já ouvi isto em Mule Variations, ou em Raindogs, ou em Swordfishtrombones, ou em Real Gone, etc, etc.” – mas isso é bom! É bom ouvirmos um novo disco do Tom Waits e não ficarmos defraudados.

Tom Waits rodeia-se dos cúmplices do costume: Marc Ribot, na guitarra, Casey Waits, filho de Tom Waits, na percussão, Clint Maedgen, nos saxes, Ben Jaffe, no trombone e clarinete, entre outros.

Mas há dois novos cúmplices, o Flea, dos Red Hot Chili Peppers e Keith Richards. Olha que dois!

Richards e Jagger são citados por Waits no tema “Satisfied”. Richards toca o seu habitual riff de guitarra e Waits vai berrando que está Satisfied, numa alusão ao célebre “Satisfaction”, dos Rolling Stones. Keith Richards toca guitarra em mais algumas faixas e faz coro com a voz de Waits em “Last Leaf”, outra balada típica de Waits, embora também faça lembrar algumas das (poucas) canções que Richards compí´s para os Stones.

“Kiss Me” é uma balada muito jazzy, em que Waits faz o seu habitual número de crooner; “Chicago” é uma espécie de melopeia, com o ritmo de um comboio; “Bad As Me” é mais uma daquelas furiosas interpretações de Waits – e todas as faixas são altamente recomendáveis.

Vai ficar no meu toca-discos durante as próximas semanas.

“Glitter and Doom Live”, de Tom Waits

waits_glitterQue pena, que raiva, que frustração não ter tido a iniciativa de programar a minha vida de modo a poder ir ver Tom Waits, por exemplo, a Milão!

Este disco é uma prova pálida do espectáculo formidável que deve ter sido esta tourné.

Waits reinterpreta, de forma irrepreensível, alguns dos seus temas mais recentes e eu fico rendido. Não precisa de cantar temas pré-Swordfishtrombones, não precisa de rebuscar nos baús da memória para ir buscar grandes êxitos de há décadas, como têm que fazer os Stones, ou McCartney, por exemplo. Waits tem evoluído, ao longo destas décadas, criando um estilo único, em que mistura valsas, polkas, tangos, blues, trash, hard, pop, histórias malucas, country, instrumentos desafinados e inventados.

E aquela voz rouca, funda, quase sinistra, faz o resto.

Prometo-me que, se o gajo fizer uma nova série de shows ao vivo, estarei atento e irei, nem que seja a Kuala Lumpur.

Sobretudo, se for em Kuala Lumpur!…

The Wire – 4ª e 5ª séries

The Wire é uma das melhores séries de televisão de sempre. Parágrafo.

wire4Por razões maiores e por pormenores.

Pormenores:

1. O tema musical da série é a canção de Tom Waits, “Way Down in the Hole“, e só por isso já merecia aplausos. Mas fizeram mais: na primeira série, escutamos o próprio Waits a interpretar o tema e nas restantes 4 séries há outras tantas versões do mesmo.

2. A série não tem um herói, mas uma panóplia de pequenos anti-heróis; no fundo, é Baltimore, a cidade, a heroína da série.

3. Omar, o bandido negro, outsider, o personagem que mais se aproxima de um herói, não só é gay como acaba por ser assassinado por um puto enfezado de 10 ou 11 anos.

wire54. Cada série debruça-se sobre um sector da cidade: os bairros sociais, o porto de Baltimore, as escolas, o jornal Baltimore Sun, a Câmara Municipal.

E as grandes razões:

A série é óptima. O apartheid envergonhado que, de facto, existe nos EUA, a inevitabilidade da corrupção na política, o papel dos advogados como coadjuvantes dos criminosos, a importância de se ser “the king of the streets”, a gente respeitável que não se importa de viver í  conta do tráfico, a violência gratuita, os jornalistas oportunistas, o ensino caótico, etc, etc.

David Simon, ex-jornalista do Baltimore Sun foi o criador da série e, juntamente com Ed Burns, ex-polícia, é o responsável pela maior parte da notável escrita da série, que não fica nada a dever aos Sopranos, por exemplo.

Fiquei sem vontade nenhuma de conhecer Baltimore…