A minha vida dava um filme – era uma rubrica, se não me engano, da revista Crónica Feminina, dos anos 60 do século passado.
A vida de qualquer pessoa dava um filme, por mais monótona ou “normal” que a vida seja. Tudo depende de quem realiza o filme. Mesma a vida sempre igual, a “vidinha”, como dizia O’Neill, pode transformar-se num grande filme – ou numa grande chatice.
Ora, pelos vistos, a curta vida de Peter Sellers (54 anos), parece ter sido tudo menos monótona. Este filme de Hopkins mostra-nos um Sellers dominado por uma mãe possessiva, muito dado a caprichos e crises de fúria, dominado pelas personagens que ele próprio foi criando, ao longo da sua carreira, desde o tempo em que ganhava a vida como cómico de rádio, até ao momento em que atingiu a celebridade, com os filmes da série Pantera Cor-de-rosa e, sobretudo, com Dr. Strangelove, de Kubrick.
Geoffrey Rush faz um excelente Peter Sellers, assumindo todos os seus tiques conhecidos: a maneira de andar, os truques vocais, os “accent”. O filme mostra-nos que Sellers não existia por si (há uma cena em que o actor se olha ao espelho e não vê nenhum reflexo). Sellers era as personagens que encarnava.
Egocêntrico, caprichoso, muito provavelmente sociopata, Peter Sellers destruiu-se a si próprio, terminando a sua carreira com “Being There” (“Benvindo Mr. Chance”), um filme sobre alguém que praticamente não existia e que, por isso mesmo, quase chegou a Presidente dos EUA.