<\/a>N\u00e3o faria mal nenhum, n\u00e3o fosse o caso de, aqui e ali, n\u00e3o se perceber o que ele quer dizer. Al\u00e9m disso, n\u00e3o houve grande cuidado na revis\u00e3o do texto, j\u00e1 que Cartier repete a mesma coisa v\u00e1rias vezes, em partes diferentes do livro. Por exemplo, sobre o her\u00f3i de BD Tintin, esclarece que o nome do seu autor Herg\u00e9, \u00e9 um pseud\u00f3nimo de Georges Remi, pelo menos, em dois trechos do livro. Tamb\u00e9m refere, em tr\u00eas ocasi\u00f5es diferentes, que a palavra “azar” prov\u00e9m do \u00e1rabe az-zahr, que significa dado. E estes s\u00e3o apenas dois de muitos exemplos de repeti\u00e7\u00f5es desnecess\u00e1rias e que poderiam ter desaparecido se o texto tivesse sido revisto.<\/p>\nComo estrangeiro que \u00e9, Cartier sacou bem alguns v\u00edcios da nossa l\u00edngua coloquial e quase que consegue ter alguma gra\u00e7a.<\/p>\n
Exemplo, com a palavra “andar”:<\/p>\n
\u00c2\u00abDeslocar-se a p\u00e9. Em outras palavras, indica e traduz a locomo\u00e7\u00e3o. Mas \u00e9 tamb\u00e9m sin\u00f3nimo de piso (Eu moro no 5\u00ba andar<\/em>). e mesmo de apartamento (Visite o nosso andar modelo<\/em>). N\u00e3o confundir com “andor” (apesar do facto de que o mesmo n\u00e3o pode andar sozinho). Se algu\u00e9m pode perfeitamente andar a correr<\/em>, a rec\u00edproca n\u00e3o existe (e porque n\u00e3o?). Usa-se tamb\u00e9m peremptoriamente associado com “tocar” na express\u00e3o definitiva, sin\u00f3nima de “E pronto!” ou “Vamos embora!”: Toca a andar<\/em>! (pronunciada: tocandar<\/em>). Encontra-se tamb\u00e9m em express\u00f5es curiosas e autom\u00e1ticas feitas principalmente pelo telefone, tais como: “Onde \u00e9 que tu andas?”, ou: “O que \u00e9 que tu andas a fazer?” Os pais podem tamb\u00e9m chamar a aten\u00e7\u00e3o do filho ou da filha, exigindo: “Anda c\u00e1!”\u00c2\u00bb<\/p>\nSe o autor se tivesse cingido \u00ed\u00a0 an\u00e1lise destas palavras ou frases da nossa linguagem do dia-a-dia, talvez tivesse conseguido fazer um livrinho coerente e simp\u00e1tico, fazendo lembrar um brilhante Elucid\u00e1rio de Conhecimentos Quase In\u00fateis (1985), de Roby Amorim, pequena publica\u00e7\u00e3o onde eram explicadas as origens dde algumas express\u00f5es correntes, como “ir para o maneta”.<\/p>\n
Mas Cartier mistura muita coisa, pequenas informa\u00e7\u00f5es lingu\u00edsticas, datas hist\u00f3ricas, cita\u00e7\u00f5es de fil\u00f3sofos e escritores franceses e at\u00e9 refer\u00eancias \u00ed\u00a0 actualidade pol\u00edtica (uma das entradas, por exemplo, \u00e9 TGV…)<\/p>\n
E por vezes, parece que se perde no portugu\u00eas, que perde o fio \u00ed\u00a0 meada. Um exemplo: a prop\u00f3sito da palavra “dias”, espanta-se por usarmos “segunda, ter\u00e7a, quarta, quinta, sexta”, enquanto os ingleses e os franceses t\u00eam um nome para cada dia da semana. Mas, depois, acrescenta: \u00c2\u00abInfelizmente, os Portugueses n\u00e3o s\u00e3o os \u00fanicos originais neste aspecto: tamb\u00e9m os Gregos (apesar dos inumer\u00e1veis deuses da Antiguidade) “traduzem” os quatro primeiros dias da semana, contando por n\u00fameros ordinais (no feminino, como em Portugu\u00eas), depois do S\u00e1bado (Savvato<\/em> que \u00e9 neutro) e do Domingo (Kuriaki<\/em>, tamb\u00e9m feminino); Sexta-feira, tamb\u00e9m no feminino, se diz Paraskevi<\/em>. Onde \u00e9 que se encontra e exclusividade ou originalidade portuguesa? Mas, de todo o jeito e em poucas palavras: Deus seja louvado<\/em>!\u00c2\u00bb<\/p>\nPerceberam? Eu n\u00e3o.<\/p>\n
E h\u00e1 muitos trechos destes no livro, o que \u00e9 pena, porque o resultado final acaba por ser um pouco entediante.<\/p>\n
Acrescentaria: o autor pergunta “Como \u00e9 poss\u00edvel ser portugu\u00eas?” e eu pergunto: “como \u00e9 poss\u00edvel uma editora publicar um livro destes?”<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"
Nascido em 1939, em Fran\u00e7a, Cartier vive em Portugal h\u00e1 anos o que o fez aventurar-se a escrever esta esp\u00e9cie de dicion\u00e1rio, directamente em portugu\u00eas. N\u00e3o faria mal nenhum, n\u00e3o fosse o caso de, aqui e ali, n\u00e3o se perceber o que ele quer dizer. Al\u00e9m disso, n\u00e3o houve grande cuidado na revis\u00e3o do texto, […]<\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"jetpack_post_was_ever_published":false,"_jetpack_newsletter_access":"","_jetpack_dont_email_post_to_subs":false,"_jetpack_newsletter_tier_id":0,"_jetpack_memberships_contains_paywalled_content":false,"_jetpack_memberships_contains_paid_content":false,"footnotes":""},"categories":[13],"tags":[839,61,486],"class_list":["post-4359","post","type-post","status-publish","format-standard","hentry","category-o-imperio-dos-estudos","tag-dicionarios","tag-livros","tag-lingua-portuguesa"],"jetpack_featured_media_url":"","jetpack_shortlink":"https:\/\/wp.me\/p2Cpjx-18j","jetpack_sharing_enabled":true,"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/4359","targetHints":{"allow":["GET"]}}],"collection":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/users\/1"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=4359"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/4359\/revisions"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=4359"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=4359"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=4359"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}