Se Bill Bryson<\/a> n\u00e3o existisse, tinha que ser inventado. N\u00e3o conhe\u00e7o nenhum outro autor como ele. Para al\u00e9m dos livros de viagens, Bryson consegue escrever sobre coisas que mais ningu\u00e9m se d\u00e1 ao “inc\u00f3modo” de escrever. S\u00e3o trivialidades, curiosidades hist\u00f3ricas, pormenores que talvez tenham mudado a hist\u00f3ria e o mundo; por exemplo, foi gra\u00e7as \u00ed\u00a0 leitura deste livro que me apercebi da import\u00e2ncia do desenvolvimento da anestesia na hist\u00f3ria da humanidade.<\/p>\n

Bryson aproveita qualquer coisa para falar de uma coisa qualquer e aplica esta t\u00e9cnica em todos os seus livros. Pode aproveitar um passeio pelas montanhas norte-americanas para nos falar de botas de sola de borracha ou contar epis\u00f3dios da sua inf\u00e2ncia e, a prop\u00f3sito, falar de quem inventou o abre-c\u00e1psulas.<\/p>\n

Dele, j\u00e1 li, sempre com muito gosto, Made in America<\/em> <\/a>(1994), onde aprendi, por exemplo, que foi na Am\u00e9rica que foi “inventado” o chop suey<\/em>, as french fries<\/em> e muita da comida “italiana”, Cr\u00f3nicas de Uma Pequena Ilha<\/em><\/a> (1995), uma colec\u00e7\u00e3o de cr\u00f3nicas sobre o Reino Unido, Por Aqui e Por Ali<\/em><\/a> (1997), a descri\u00e7\u00e3o bem humorada de uma caminhada de mais de tr\u00eas mil quil\u00f3metros pelos Apalaches norte-americanos,\u00c2\u00a0Notas sobre um Pa\u00eds Grande<\/em><\/a> (1998), uma s\u00e9rie de cr\u00f3nicas sobre os States, Breve Hist\u00f3ria de Quase Tudo<\/em> (2003), cujo t\u00edtulo diz tudo sobre quase nada e A Vida e as Aventuras do Rapaz Rel\u00e2mpago<\/em><\/a> (2006), onde, a prop\u00f3sito da sua inf\u00e2ncia, nos fala da inven\u00e7\u00e3o do frigor\u00edfico e da televis\u00e3o, da banda desenhada e dos gelados, da Grande Guerra e do algod\u00e3o doce.<\/p>\n

<\/a>Neste\u00c2\u00a0At Home – A Short History of Private Life<\/em>, a prop\u00f3sito da casa onde vive, em Inglaterra, Bryson vai-nos contando, divis\u00e3o a divis\u00e3o, como surgiram as v\u00e1rias depend\u00eancias de uma habita\u00e7\u00e3o, como se desenvolveram as lareiras, as roupas, a ilumina\u00e7\u00e3o, os estuques, os revestimentos, os jardins, a rela\u00e7\u00e3o entre os senhores e os criados, a alimenta\u00e7\u00e3o, as pragas, os animais dom\u00e9sticos e muitos etc.<\/p>\n

O que mais me impressiona nos livros de Bryson \u00e9 a quantidade de pormenores “insignificantes” que n\u00e3o encontrar\u00edamos em mais lado nenhum, fruto, certamente, de uma pesquisa incessante e, diria, obsessiva.<\/p>\n

Os exemplos sucedem-se. O que ser\u00e3o, por exemplo, os rotten boroughs<\/em>?<\/p>\n

“Os rotten\u00c2\u00a0<\/em><\/em>boroughs eram aqueles (c\u00edrculos eleitorais) em que um membro do Parlamento podia ser eleito por um pequeno n\u00famero de pessoas, como acontecia em Bute, na Esc\u00f3cia, onde apenas um residente em catorze mil tinha o direito de votar, pelo que, obviamente, poderia eleger-se a si pr\u00f3prio.”<\/em><\/p>\n

E de onde vem o nome da banda rock Jethro Tull<\/a>, cujo primeiro \u00eaxito foi “Living in the Past?”<\/p>\n

Bryson revela: “Os agricultores tamb\u00e9m beneficiaram de um novo aparelho com rodas inventado, por volta de 1700, por Jethro Tull, um agricultor e pensador agr\u00edcola de Berkshire”.<\/em><\/p>\n

A curiosidade de Bryson leva-o a coscuvilhar estat\u00edsticas, em busca de informa\u00e7\u00f5es de que mais nenhum autor se lembraria. A prop\u00f3sito das escadas e dos acidentes\u00c2\u00a0e elas podem provocar, escreve: “N\u00e3o surpreende que descer uma escada seja muito mais arriscado que subir. Quase 90% de todas as les\u00f5es ocorrem durante a descida. A probabilidade de sofrer uma queda grave \u00e9 de 57 % em lan\u00e7os direitos de escadas, mas apenas de 37% em escadas com algum desvio. Os patamares tamb\u00e9m de obedecer a uma determinada dimens\u00e3o – o comprimento de um degrau mais o comprimento de um passo \u00e9 considerado o correcto – para n\u00e3o quebrarem o ritmo do utilizador da escada. O ritmo interrompido \u00e9 considerado o prel\u00fadio para uma queda”.<\/em><\/p>\n

A pouca import\u00e2ncia que a Medicina tinha na vida das pessoas dos s\u00e9culos passados, devido ao pouco que tinha para oferecer \u00ed\u00a0s pessoas, est\u00e1 bem patente neste exemplo, que Bryson nos conta:<\/p>\n

“Sem grande surpresa, por vezes as pessoas, levadas pela dor e por uma cautela natural em rela\u00e7\u00e3o aos m\u00e9dicos, experimentavam rem\u00e9dios extremos em casa. Gouverneur Morris, um dos signat\u00e1rios da Declara\u00e7\u00e3o de Independ\u00eancia, matou-se ao for\u00e7ar uma barba de baleia pelo p\u00e9nis acima, para tentar limpar um bloqueio urin\u00e1rio.”<\/em><\/p>\n

A prop\u00f3sito dos h\u00e1bitos de higiene, Bryson explica que, at\u00e9 h\u00e1 bem pouco tempo, a lavagem de todo o corpo n\u00e3o era uma t\u00e9cnica muito apreciada:<\/p>\n

“Lavar as m\u00e3os muito, os p\u00e9s pouco e a cabe\u00e7a nunca, era um prov\u00e9rbio ingl\u00eas comum. A rainha Isabel, numa cita\u00e7\u00e3o\u00c2\u00a0 muito referida, tomava banho sempre uma vez por m\u00eas, ‘quer ela precise ou n\u00e3o’. Em 1653, John Evelyn, o cronista, registou a decis\u00e3o hesitante de lavar o cabelo anualmente. Robert Hooke, o cientista, lavava os p\u00e9s com frequ\u00eancia (porque o tranquilizava), mas parece n\u00e3o ter passado muito tempo h\u00famido acima dos tornozelos. No di\u00e1rio que manteve durante nove anos e meio, Samuel Pepys s\u00f3 refere uma vez que a esposa tenha tomado banho. Em Fran\u00e7a, o rei Luis XIII ficou sem tomar banho quase at\u00e9 ao s\u00e9timo anivers\u00e1rio, em 1608.”<\/em><\/p>\n

E chega de cita\u00e7\u00f5es. Bryson enche-nos destas pequenas informa\u00e7\u00f5es e mantem-nos agarrados \u00ed\u00a0 leitura de mais este livro, ao longo das suas mais de 500 p\u00e1ginas.<\/p>\n

 <\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Se Bill Bryson n\u00e3o existisse, tinha que ser inventado. N\u00e3o conhe\u00e7o nenhum outro autor como ele. Para al\u00e9m dos livros de viagens, Bryson consegue escrever sobre coisas que mais ningu\u00e9m se d\u00e1 ao “inc\u00f3modo” de escrever. S\u00e3o trivialidades, curiosidades hist\u00f3ricas, pormenores que talvez tenham mudado a hist\u00f3ria e o mundo; por exemplo, foi gra\u00e7as \u00ed\u00a0 […]<\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"jetpack_post_was_ever_published":false,"_jetpack_newsletter_access":"","_jetpack_dont_email_post_to_subs":false,"_jetpack_newsletter_tier_id":0,"_jetpack_memberships_contains_paywalled_content":false,"_jetpack_memberships_contains_paid_content":false,"footnotes":""},"categories":[6],"tags":[238,61],"class_list":["post-4487","post","type-post","status-publish","format-standard","hentry","category-lido","tag-bill-bryson","tag-livros"],"jetpack_featured_media_url":"","jetpack_shortlink":"https:\/\/wp.me\/p2Cpjx-1an","jetpack_sharing_enabled":true,"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/4487","targetHints":{"allow":["GET"]}}],"collection":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/users\/1"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=4487"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/4487\/revisions"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=4487"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=4487"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=4487"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}