Sempre achei curiosa a leitura de coment\u00e1rios de visitantes estrangeiros ao nosso pa\u00eds, depois do terramoto de 1755. Li-os, esporadicamente, em artigos de jornal.<\/p>\n\n\n\n
Maria Filomena M\u00f3nica fez-nos o favor de ler dezenas de publica\u00e7\u00f5es em que diversos autores estrangeiros comentam visitas ao nosso pa\u00eds, desde o s\u00e9culo 18 ao s\u00e9culo 20.<\/p>\n\n\n\n
A lista de autores \u00e9 extensa, come\u00e7ando com Giuseppe Baretti, logo a seguir ao terramoto, e passando por muitos outros, uns mais conhecidos que outros; destaco, apenas, William Beckford, Lord Byron, Joseph Forrester, Hans Christian Andersen, Mark Twain, Miguel Unamuno, Saint-Exup\u00e9ry, Simone de Beauvoir, Sartre, Gabriel Garcia Marquez e Enzensberger.<\/p>\n\n\n\n
Os diversos turistas que por c\u00e1 passaram at\u00e9 ao final do s\u00e9culo 19 e princ\u00edpio do s\u00e9culo 20 foram un\u00e2nimes em considerar os portugueses feios, porcos e maus, as ruas de Lisboa sujas e cheias de c\u00e3es e mendigos, os nobres uns pedantes iletrados e o povo, uma cambada de analfabetos, sujos e maltrapilhos.<\/p>\n\n\n\n
Claro que uns mais e outros menos, acharam que o pa\u00eds era bonito, o povo \u00e9 que nem por isso.<\/p>\n\n\n\n
As coisas melhoraram um pouco, \u00ed\u00a0 medida que o s\u00e9culo 20 foi avan\u00e7ando e, depois da revolu\u00e7\u00e3o de abril, as visitas foram sobretudo pol\u00edticas. Destas, destaco os escritos de Gabriel Garcia Marquez, que, sobre a euforia post-25 de abril, escreveu:<\/p>\n\n\n\n
“\u2026Toda a gente fala e ningu\u00e9m dorme. A maioria das pessoas trabalha sem hor\u00e1rios e sem pausas, apesar de os portugueses terem os sal\u00e1rios mais baixo da Europa. Marcam-se reuni\u00f5es para altas horas da noite, os escrit\u00f3rios ficam de luzes acesas at\u00e9 de madrugada\u2026 Se alguma coisa vai dar cabo desta revolu\u00e7\u00e3o \u00e9 a conta da luz”\u009d.<\/em><\/p>\n\n\n\n Nem todos os visitantes do s\u00e9culo 19 disseram mal dos trabalhadores portugueses. Forrester, que esteve por c\u00e1 em 1831, escreveu:<\/p>\n\n\n\n “\u2026T\u00eam uma apar\u00eancia desleixada, mas isso deve-se a serem pobres, andarem mal cal\u00e7ados e estarem mal alimentados. Mas s\u00e3o alegres, felizes, espertos, generosos, hospitaleiros, honestos, trabalhadores, s\u00f3brios, sofredores, perseverantes e destitu\u00eddos de ambi\u00e7\u00f5es.”\u009d<\/em><\/p>\n\n\n\n Tantos adjectivos, deixam-nos confusos!<\/p>\n\n\n\n Oswald Crawfurd visitou Portugal em 1866, mas esta sua frase podia ter sido escrita actualmente:<\/p>\n\n\n\n “\u2026Se for suficientemente rico, um nobre portugu\u00eas vive em Lisboa ou no Porto e se tiver uma casa no campo, apenas a visita um ou dois meses no outono; e, mesmo quando \u00e9 o caso, muitas vezes prefere a mis\u00e9ria de um casebre na praia, entre uma multid\u00e3o, \u00ed\u00a0 vida no interior do pa\u00eds.”\u009d<\/em><\/p>\n\n\n\n A primeira vez que Simone de Beauvoir veio a Portugal foi em 1945, em plena ditadura salazarista.<\/p>\n\n\n\n Eis o que escreveu:<\/p>\n\n\n\n “\u2026Desde que uma mi\u00fada seja crescida, como aquela que vi a remexer nos caixotes de lixo do Porto “\u201c isto \u00e9, que tenha a\u00ed uns 14 ou 12 anos “\u201c procurar\u00e1 ganhar dinheiro seja de que maneira for. Das 194 prostitutas que haviam sido tratadas num centro de sa\u00fade, 43% eram menores; o governo d\u00e1 uma carteira profissional \u00ed\u00a0s mulheres desde que tenham 14 anos.”\u009d<\/em><\/p>\n\n\n\n E mais \u00ed\u00a0 frente:<\/p>\n\n\n\n “\u2026O povo portugu\u00eas sempre foi pobre. Mas desde 1939 que o custo de vida aumentou 140% e, nalguns produtos, at\u00e9 mais, uma vez que um fato completo que, antes da guerra, custava 350 escudos, agora custa entre 1200 a 1500\u2026 Uma lei pro\u00edbe que as pessoas andem descal\u00e7as no interior da cidade de Lisboa, bem como nos arredores, mas esta gente tira os chinelos porque n\u00e3o os quer gastar\u2026 pois n\u00e3o tinha possibilidade de comprar outros (sapatos)”\u009d.<\/em><\/p>\n\n\n\n O \u00faltimo visitante, Enzensberger, conclui:<\/p>\n\n\n\n “\u2026Se as estat\u00edsticas fossem verdadeiras, a maior parte dos portugueses estavam mortos.”\u009d<\/em><\/p>\n\n\n\n Livro muito curioso e que fazia muita falta.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" Sempre achei curiosa a leitura de coment\u00e1rios de visitantes estrangeiros ao nosso pa\u00eds, depois do terramoto de 1755. Li-os, esporadicamente, em artigos de jornal. Maria Filomena M\u00f3nica fez-nos o favor de ler dezenas de publica\u00e7\u00f5es em que diversos autores estrangeiros comentam visitas ao nosso pa\u00eds, desde o s\u00e9culo 18 ao s\u00e9culo 20. A lista de […]<\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"jetpack_post_was_ever_published":false,"_jetpack_newsletter_access":"","_jetpack_dont_email_post_to_subs":false,"_jetpack_newsletter_tier_id":0,"_jetpack_memberships_contains_paywalled_content":false,"_jetpack_memberships_contains_paid_content":false,"footnotes":""},"categories":[6],"tags":[61,1236,459],"class_list":["post-8329","post","type-post","status-publish","format-standard","hentry","category-lido","tag-livros","tag-maria-filomena-monica","tag-portugal"],"jetpack_featured_media_url":"","jetpack_shortlink":"https:\/\/wp.me\/p2Cpjx-2al","jetpack_sharing_enabled":true,"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/8329","targetHints":{"allow":["GET"]}}],"collection":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/users\/1"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=8329"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/8329\/revisions"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=8329"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=8329"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.coiso.net\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=8329"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}