Sexta, 28
22h 00 – Chegada a Manaus - Visita da cidade - Encontro
das águas
Vamos lá tentar descrever as últimas horas,
mas vai ser difícil porque, mais uma vez, nem tempo
há para escrever, a menos que eu andasse sempre com
o caderninho atrás.
Ontem, chegámos ao aeroporto de Manaus por volta
das 21h locais (menos 4h do que em Portugal) e estivemos
mais de uma hora para passar na alfândega. Dois funcionários
zelosos examinavam os passaportes, os papéis de entrada
no Brasil, carimbavam, tudo a uma velocidade moderada o
que, para cerca de 200 passageiros, fez com que a fila se
mantivesse quase incólume durante tempo indeterminado.
Quando, finalmente, saímos do aeroporto, fomos logo
atingidos por uma baforada de ar quente e húmido
e os meus óculos ficaram embaciados. No ar, um cheiro
forte a bolor. Não havia dúvida: estávamos
na Amazónia.
Cerca de 20 minutos depois, estávamos no Hotel Tropical,
um edifício de três pisos, que se alonga horizontalmente.
Ficámos no quarto 531 do 1º piso, o que quer
dizer que tivemos que atravessar três corredores imensos,
com portas de um lado e outro, fazendo lembrar um hotel
de Las Vegas, mas na horizontal...
Hoje de manhã, partimos para a visita da cidade.
Aqui, na Amazónia, é Inverno, o que quer dizer
que a temperatura não ultrapassa os 35 graus e chove.
Felizmente, a temperatura, hoje, não atingiu níveis
tão elevados. Talvez tenham estado uns 30 graus...
E, de manhã, chovia. Mas a chuva não incomoda;
nós molhamo-nos mas depressa secamos...
A cidade de Manaus é feia e desorganizada –
casas de dois pisos com azulejos e varandas de ferro forjado,
fazendo lembrar as casas dos nossos emigrantes, outras pintadas
de verde-cueca ou amarelo-diarreia, prédios tipo
Reboleira, muitas barracas, verdadeiras favelas, algumas
delas assentes em palafitas, sobre o rio Negro. Parámos
para ver o Teatro Amazonas, que foi construído nos
finais do século XIX, na altura em que Manaus era
uma cidade rica, graças à borracha. O interior
do Teatro é um luxo: mármores italianos, veludos
russos, ferro inglês e escocês, pedras portuguesas,
madeira brasileira, mas que era enviada para a Europa para
ser tratada. Após a visita ao Teatro, passámos
por uma lojinha, onde fizemos as primeiras compras de artesanato
local. Seguiu-se uma visita rápida ao Museu do Índio
e, finalmente, o Mercado Municipal. Mais compras: a Mila
comprou pulseiras e brincos para toda a gente, zarabatanas,
maracas e outras miudezas.
Regressámos ao hotel para embarcar num pequeno barco,
que fez a travessia do rio Negro (8 km). Na outra margem,
esperava-nos o almoço, no restaurante Salvador Lake,
mesmo junto às margens do rio. Assim que nos sentámos,
levantou-se uma grande ventania e caiu uma chuvada tipicamente
tropical, acompanhada de trovoada. Ninguém se ralou.
Mais compras numa lojinha do restaurante.
Nesta foto distinguem-se, perfeitamente, as águas
escuras do rio Negro e as castanhas do Amazonas
Regressámos ao barco e iniciámos uma viagem
de cerca de hora e meia, até ao Encontro das Águas.
Neste local, o rio Negro encontra-se com o rio Solimões.
Esclareça-se que o rio Negro tem este nome porque
as suas águas são mesmo escuras, cor de chá
ou coca-cola, devido a estarem carregadas de ácido
tânico, das cascas das árvores que as cheias
submergem. As árvores, no entanto, apesar de ficarem
submersas durante meses, não apodrecem, porque as
águas são muito ácidas. Quanto ao rio
Solimões, não é outro senão
o Amazonas, que toma diversos nomes conforme os locais por
onde passa. As águas do Solimões são
castanhas e barrentas, devido às terras que arrasta
consigo. Quando o rio Negro desagua no Solimões,
as suas águas encontram-se mas não se misturam
imediatamente, devido à diferente composição
química. Por isso, quando chegamos a esse tal Encontro
das Águas, podemos ver um fenómeno da natureza:
as águas dos dois rios perfeitamente separadas –
as águas negras do rio Negro encostadas às
águas castanhas do Solimões, sem se misturarem.
Curioso fenómeno ese, que proporcionou mais algumas
fotos.
Regressámos ao hotel, onde chegámos já
depois das 17h 30.
À noite, o jantar foi seguido de um espectáculo
de folclore local – boi bumbá, como lhe chamam.
Meninas e meninos, vestidos de índios, dançaram
e cantaram. Muitos pulos, muita anca meneada, muitas penas
de arara.
E amanhã vamos para a selva!
Sábado, 29
14h 00 – Caminhada na Selva
Na cabana 9-A do Eco Park Amazonas.
Não podia haver melhor final para esta Volta ao Mundo,
que começou na savana africana, do que a selva amazónica.
Partimos cedo, a bordo do barco Almirante Roque, rio Negro
acima. Éramos 41 pessoas. Metade do grupo fez a visita
à Amazónia ontem e outra parte do grupo foi
para outro local. Subimos o rio durante 40 minutos e chegámos
ao Eco Park. Divimo-nos em dois grupos, cada um com um guia
e fizemos uma caminhada pela selva durante cerca de hora
e meia. O calor húmido fez-nos suar como numa sauna.
Eu não sabia que o meu suor podia nascer assim, de
todos os meus poros. Às tantas, escorria suor. Quando
chegámos à cabana, tínhamos a roupa
encharcada, cuecas incluídas.
O guia parava de vez em quando, dando explicações
sobre a flora e a fauna desta selva imensa. Foi, sem dúvida,
um dos pontos altos desta viagem. Lianas, árvores
de onde se fazem as canoas, formigas gigantes, fungos e
cogumelos vários, árvores com nomes índios,
vegetação luxuriante, insectos em concerto,
cigarras que pareciam serras eléctricas, pássaros
e passarocos.
Depois da caminhada, fizemos um curto percurso de canoa,
com motor, até a um local onde cuidam de macacos,
para os devolver à floresta.
Só depois, pudemos descansar um pouco na cabana,
que é apenas um quarto com duas camas e uma pequena
casa de banho – mas é bem engraçada
e até tem ar condicionado!
18h 00 – Visita do Sítio e pesca de piranha
O ar condicionado é um aparelho antigo que faz lembrar
o motor de um barco. No entanto, isso não impediu
que, após o almoço, adormecêssemos!
Dormimos meia-hora, se tanto.
Às 15h, partimos de canoa para visitar a casa de
uma cabocla, que vive aqui na zona. D. Safira tem 67 anos,
vive no Eco Park desde os 20 anos, disseram-nos. O caboclo
resulta da misturas entre o português, o índio
e o negro. D. Safira mostrou-nos o seu Sítio, as
coisas que cultiva, queixou-se das formigas, que lhe destroem
tudo e da solidão (o marido morreu há 2 anos
e ela vive sozinha na selva).
De seguida, partimos para outro lugar do rio Tarumã,
afluente do Negro, e parámos para pescar piranha.
Durante meia-hora, cerca de 40 turistas fizeram figura de
parvos, de caninha na mão, tentando pescar piranha.
Finalmente, um dos guias pescou um peixe daqueles com nomes
parecidos com pirarucu, ou coisa que o valha, e regressámos
ao Eco Park, onde vimos um pouco do Portugal-Brasil. Mas
eu não estava com vontade de ver futebol, com o rio
e a selva ali tão perto. Fomos, primeiro, experimentar
deitarmo-nos na rede e relaxar e, depois, para a praia,
ver o anoitecer e maravilharmo-nos com os cambiantes da
luz do rio, das árvores e do céu.
Que maravilha!
22h 15 – Depois do jantar
Assistimos a mais um espectáculo de boi bumbá,
uma mistura de tradição índia com sintetizadores.
Desta vez, foi o grupo “Filhos da terra” e a
coisa foi mais à séria. Segundo nos informaram,
este folclore mistura coisas dos índios, nordestinos
e portugueses (daí, o boi...), de escravos negros
e tudo isto muito actualizado com ritmos próximos
do reggae. Enfim, visualmente até foi interessante...
Domingo, 30
15h 15 – Nascer do sol na selva
Hoje acordámos às 5 da matina, com o propósito
de ver o nascer o sol na selva.
Metemo-nos na canoa e navegámos até a um certo
sítio. O sol era suposto nascer por ali. Só
que o céu estava nublado e, depois de termos esperado
até às 6 e picos, acabámos por desistir.
Em alternativa, navegámos por um braço do
rio que, a partir de certa altura, está cheio de
copas de árvores que foram submersas pela subida
das águas. Chama-se a isto, iguapó, ou caminho
de canoa, ou coisa que o valha. No verão, as águas
descem e as canoas já não passam ali. Flutuámos
algum tempo, ouvindo os barulhos da selva, sobretudo, o
canto de algumas aves.
Regressámos ao Eco Park, tomámos o pequeno-almoço
e, às 9h, voltámos, de barco, para Manaus,
de regresso ao nosso quarto, para um duche. O resto da manhã
foi apenas passar tempo até serem horas de almoçar,
fazer o check out e avançar para o aeroporto; mas
ainda pudemos assistir a uma chuvada tropical – a
chuva parecia cordas caindo de um céu carregado.
No aeroporto esperavam-nos rigorosas medidas de segurança.
Foram quase 2h de fiscalização das malas de
mão e apreensão de sprays e outros objectos
considerados potencialmente perigosos. Terá sido
vingança pelo facto do Brasil ter perdido 1-2 com
Portugal e do 2º segundo golo português ter sido
marcado pelo brasileiro Deco?
Faltam 20 minutos para as 18h e já estamos no avião.
De manhã, falámos com a Marta, o Pedro e o
Sousa. Em Portugal, a hora mudou ontem, o que quer dizer
que vamos chegar uma hora mais tarde. Parece que tem estado
a chover por lá. Já estamos com saudades...
Amazónia em poucas palavras
Calor húmido, cheiro a bolor, favelas assentes em
palafitas, vegetação intensa, luxuriante,
o rio Negro, de águas cor de chá, o Solimões,
barrento, o Encontro das Águas, o concerto dos insectos,
à noite, as araras e os papagaios, o por do sol,
de cenário, a selva que se basta a si própria,
a chuva tropical, frutos estranhos, plantas desconhecidas,
rios imensos, o barulho silencioso da selva.
19h 00 – Manaus-Lisboa
Levantámos voo às 18h 05. Vamos demorar 8h
20 para fazer 7 000km, sobrevoando Suriname, Guiana francesa
e, depois, a imensidão do Atlântico.
Distribuíram um questionário de qualidade.
Querem saber o que pensamos desta Volta do Mundo. O melhor
possível, claro. No final do inquérito, pedem
sugestões para um percurso de uma futura Volta ao
Mundo.
A minha sugestão: Madagáscar – Maldivas
– Nova Zelândia – Peru – Costa Rica.
Outro percurso possível: Alexandria – Pequim
– Melbourne – El Salavdor – Jamaica.
Outro ainda: Abu Dabi – Xangai – Seattle –
Otawa – Cuba
Segunda, 31
15h 30 – Almada
São 18h 30 no Quénia, 21h na Índia,
4h 30 (do dia seguinte) em Sydney, 5h 30 no Tahiti, 10h
30 em Santiago e em Manaus.
Estão a ver a bagunça que vai nas nossas cabeças?
Aterrámos em Lisboa às 7h 07 e o comandante
Carlos recebeu uma calorosa salva de palmas. Foi mais um
voo tranquilo e seguro. Totalizámos 58h de voo e
47 mil quilómetros.
Depois de aterrarmos, tirámos uma foto de grupo,
com toda a tripulação e colaboradores da Air
Luxor.
Já estamos a pensar na próxima Volta ao Mundo!
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