Mirem-se no exemplo de Falciano del Massico

Falciano del Massico é uma pequena localidade, a 50 km de Nápoles, com apenas 3700 habitantes, mas sem cemitério.

Como forma de protestar contra esta falha, o presidente da câmara local, Giulio Fava, publicou um decreto municipal que proíbe os munícipes de morrerem.

Leram bem: em Falciano del Massico é proibido morrer.

Só que, esta semana, dois cidadãos resolveram infringir a lei e morreram mesmo.

Fava não sabe o que há-de fazer.

Que castigo se aplica a dois cidadãos que não cumprem a lei, mas que estão falecidos?

Esta singela história mostra bem como há sempre ovelhas negras na melhor das democracias.

Que melhor forma de se protestar contra o facto de não termos um cemitério, se não recusarmos morrer?

E, mesmo assim, tinha que haver dois palermas a furarem o protesto!

Claro que em Portugal, isto seria impossível, já que o ministro Miguel Ervas nunca permitiria que uma comunidade com apenas 3700 habitantes tivesse direito a ter um presidente da Câmara – quanto mais um cemitério!

Por que é que não tenho uma casa da Câmara?

—Antes de continuarem a ler este texto, agradeço que leiam esta pequena local, que saiu hoje no Expresso, a propósito do “Lisboagate” – distribuição de casas da Câmara a amigos e camaradas, por cunhas, pagamento de favores e outras trafulhices.

Já leram?

Então, agora, falo eu: em Junho de 1974, estudava no 2º ano de Medicina, tinha um filho, o Pedro, com um ano de idade e vivia num quarto, em casa dos meus sogros. Há mais de uma ano que colaborava, com estorinhas, poemas e outras brincadeiras, com o jornal República. Gratuitamente. “Just for fun”.

O ílvaro Guerra, que já não está por cá, achou que eu era bem capaz de ser jornalista e como, entretanto, depois do 25 de Abril, passara do República para a RTP, convidou-me para experimentar o jornalismo televisivo.

Não hesitei, claro.

Comecei por ganhar um salário de 7.500 escudos, que era excelente, naquela altura. Continuei a estudar, durante o dia, e a trabalhar no Telejornal da noite que, naqueles tempos, ia para o ar quando calhava, por vezes, depois da uma da manhã.

Graças ao ílvaro Guerra e ao meu emprego como jornalista estagiário, conseguimos sair da casa dos meus sogros e alugar um T1, em Benfica, por 3.500 escudos. Sobravam 4 mil escudos, do meu ordenado. Até dava para beber um gin tónico todos os dias!

Algum tempo depois, juntámo-nos ao nosso amigo José António, também jornalista, na altura, além de estudante de Matemática, e alugámos uma casa em Algueirão. Tinha dois andares: o rés-do-chão para nós, o primeiro andar para os amigos. Renda: 6 mil escudos mensais.

Nessa casa, nasceu a nossa Marta e a Joana deles.

“Obla-di Obla-da, life goes on…”

Em Setembro de 1987, 14 anos depois do 25 de Abril, já longe do jornalismo e trabalhando como Médico de Família há dois anos, conseguimos comprar a nossa primeira e única casa, em Almada.

Ainda a estamos a pagar.

Por isso, peço desculpa pela minha linguagem, mas quero que todos estes gajos façam o favor de ir í  merda!