Entre dezembro de 1983 e março de 1985 escrevi mais de 30 crónicas que foram lidas e interpretadas pelo Raul Solnado, primeiro, no programa Fim de Semana, na RTP-1, depois no Programa da Manhã, da Rádio Comercial.
Prisões superlotadas (4.2.1984)
Venho aqui falar em nome dos pequenos e médios ladrões. Larápios, carteiristas e ofícios correlativos.
Bom… para que não haja confusões, eu não sou o porta-voz dessas profissões que são ““ sem dúvida ““ as mais antigas do mundo… mas li no jornal uma notícia que me deixou revoltado.
É que a crise ataca todos e não escapa ninguém!
Já não basta um tipo ter que palmar 4 ou 5 carteiras no metropolitano, pondo em risco a sua integridade física… e depois, chega a casa e as carteiras só têm documentos e fotografias da família ““ num uma nota para amostra!
Andamos todos tesos!
E os pequenos roubos já não dão lucro! É um risco que não vale a pena correr.
Hoje em dia, ou se rouba a sério, assim uma coisa em grande, com estilo, ou mais vale arranjar um emprego, nem que seja com contrato a prazo numa empresa em situação económica difícil!
E depois, ainda por cima, como um azar nunca vem só, andaram a colar aqueles cartazes as estações do Metro, que dizem “…cuidado com os carteiristas”!
E as pessoas estão sempre a pau, com a mãozinha a segurar a carteira.
Depois vem um carteirista mais inexperiente, tenta palmar qualquer coisita e pimba!… é apanhado com a boca na botija!
A polícia está farta, já não fecha os olhos a nada e lá vai o larápio para a prisão!
É aqui que entra a notícia… segundo a Direcção Geral dos Serviços Prisionais, as 48 cadeias portuguesas estão a abarrotar.
6 478 presos! Não cabe nem mais um! Lotação esgotada!
É uma situação que não se registava desde 1967 ““ há 17 anos, portanto!
Estão a ver isto?!
Se um larápio qualquer for apanhado pela polícia, fica preso onde?…
As escolas são poucas para os alunos.
Os hospitais não chegam para os doentes.
Os edifícios públicos são pequenos para as repartições.
Isto não pode continuar assim!…
Se esta noite mesmo, um polícia de giro capturar algum rato de automóveis, não tem outro remédio senão levá-lo para casa, dar-lhe jantar e depois fechá-lo na despensa, í espera que haja vaga em Alcoentre!
Sinceramente, só vejo uma solução: enquanto não se construírem mais prisões, levem os presos para os museus.
Ao menos assim, os museus portugueses deixavam de estar í s moscas.
Boa noite e façam o favor de ser felizes.